Dificuldade de adequar burocracia à realidade de pequenos produtores para execução de programas foi apontada durante o seminário ‘Políticas Públicas para Agroecologia’, realizado durante a 14º Jornada de Agroecologia.
A burocratização dos programas governamentais de promoção da produção de alimentos saudáveis foi um dos pontos destacados durante o Seminário Temático sobre Políticas Públicas para a Agroecologia, na manhã desta sexta-feira (24). Organizado pela Terra de Direitos e realizado durante a 14ª Jornada de Agroecologia, o seminário reuniu organizações e movimentos sociais para debater o cenário de incentivos ou limitações por parte do governo federal no desenvolvimento da agroecologia.
Gelson Luiz de Paula, da Associação Assis, trouxe seu caso como exemplo das limitações, em razão da burocracia imposta aos agricultores familiares. Ele foi uma das sete pessoas presas em 2013, em operação da Polícia Federal, sob acusação de irregularidades na execução do Programa de Aquisição de Alimentos. A ação foi resultado da falta de adequação dos formulários exigidos pelo Programa com a realidade dos pequenos agricultores. “Apesar da burocracia e das dificuldades, não tinham técnicos para nos ajudar”, indica. “A gente pode ter cometido erro administrativo, mas não irregularidade e desvio de recursos”.
A partir da operação da Polícia Federal, as exigências para a execução do PAA ficaram ainda maiores e cada vez mais distantes da realidade dos produtores. Dos 212 programas previstos em 2013 no Paraná, apenas sete permanecem até o momento no estado.
O distanciamento entre produtores e o modelo de política interfere no desenvolvimento da agroecologia. Segundo Celso Lacerda, da Fundação Terra, existem poucos trabalhos de reconhecimento, incentivo ou orientação a esse modo de produção, em razão do baixo retorno financeiro. “É por isso que os investimentos devem ser públicos”, aponta.
Solange, do Movimento das Mulheres Camponesas, também destacou a necessidade de se pensar políticas públicas para agroecologia que levem em consideração a questão de gênero. “Assim como esse modelo econômico está alicerçado no agronegócio, está também no patriarcado”, aponta. Ela relata que as mulheres são, muitas vezes, excluídas forçadamente dos espaços espaços políticos. “Sem feminismo não se faz agroecologia”.
Avançamos, mas desafios permanecem
Os avanços e os desafios na implantação de políticas públicas voltadas para a agroecologia foram destacadas pelos participantes do Seminário. Elson Borges dos Santos, conhecido como Zumbi, aponta que a Plano Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica (Planapo) é um importante instrumento que só existe no Brasil.
A ponte construída entre Governo Federal e sociedade civil, a criação do Ecoforte (programa de apoio a redes de agroecologia), a assistência técnica específica para agroecologia e a previsão de construção de um Programa Nacional de Redução de Agrotóxicos são algumas da vitórias da Planapo, segundo aponta Zumbi.
Natália Almeida, da Campanha Permanente Contra Agrotóxicos, falou sobre a construção do Programa Nacional de Redução dos Agrotóxicos (Pronara). Tal proposta faria com que a utilização dos agroquímicos fosse regularizada no país. Desde 2008, o Brasil é o país que mais consome agrotóxicos no mundo – em 2014, cada brasileiro consumiu, em média, 7,4l de veneno.
Ao mesmo tempo em que observa-se alguns avanços, Zumbi também considera que existem dificuldades. “Nós temos como desafio construir a Planapo 2.0. Nosso 1.0 está com um motor mais fraco”, brinca. Maior participação social e popularização da política foram alguns dos desafios trazidos pelo rapaz. Zumbi também destacou que importante lutas ficaram de fora da primeira versão da Planapo. O conceito de reforma agrária, o debate da preservação da água, e a falta de criação de um fundo específico de agroecologia, assim como de um órgão de participação social como o Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea) são alguns exemplos.