O primeiro dia do Encontro dos Movimentos Populares com o Papa contou com discussões, atividades culturais, depoimentos e gritos de luta. Pela manhã, os participantes receberam as boas-vindas dos membros da mesa de inauguração composta por Padre Geraldo Barbosa da Arquidiocese de Mariana, João Paulo Paranhos, secretário de Mariana, o deputado federal Padre João, Nilmário Miranda, Secretário Estadual de Direitos Humanos, o Vereador Cristiano Vilas Boas, presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara, Marcelo Villarrica do Movimiento dos Trabajadores Excluídos da Argentina e Beatriz Cerqueira, coordenadora-geral do Sind-UTE/MG, todos falaram sobre o crime ocorrido em Mariana e sobre a situação política que o país enfrenta. Beatriz encerrou com uma homenagem a cada um dos mortos pela lama da barragem de Fundão.
Em seguida João Pedro Stédile do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST) e Daniel Seidel, professor da Universidade de Brasília (UnB), fizeram uma análise da conjuntura e discutiram a reforma política. O ponto forte da discussão foi o esgotamento do atual modelo econômico e a necessidade de se criar um novo projeto de Brasil. “Esse capitalismo está em crise porque é dominado hoje por apenas 1% de milionários que são donos dos bancos e das grandes corporações, no Brasil isso representa apenas 76 mil pessoas milionárias”, explica Stédile. Já o professor da UnB lembrou que essa democracia formal, que está hoje em decadência, nasceu juntinho com o capitalismo.
À tarde “Terra” foi o tema da primeira mesa de debates da programação, composta por Tiago Valentim da Comissão Pastoral da Terra (CTP) e Rosângela Piovizani do Movimento de Mulheres Camponesas (MMC). Piovizani lembrou que 51% dos estabelecimentos rurais são, hoje, do agronegócio e apenas 11% da reforma agrária, “são os camponeses do país que mantém mais de 70% da produção de alimentos do Brasil e convivemos com uma ameaça real ao nosso território, além disso, somente 3% das unidades de pequena produção está no nome das mulheres”, reiterou. “Depois que uma empresa ou um latifundiário destrói toda aquela área, quando a terra já não tem nem condições de produzir, essa terra é colocada nas mãos de camponeses e camponesas”, problematizou ainda Valentim.
Durante todos os debates nenhum dos componentes das mesas deixou de citar o golpe que sofremos e de incentivar as mobilizações para que derrubemos o governo golpista, além de conclamar os movimentos à proposição e construção de um novo projeto para o Brasil.
À noite o evento foi encerrado com uma Noite Cultural na Praça Jardins com típicas apresentações mineiras como Congado, bonecos gigantes e coloridos conhecidos como Zé Perêrê e uma Seresta.
Fernanda Carvalho
Carta do Encontro Brasileiro de Movimentos Populares em Dialogo com o Papa FranciscoCarta do Encontro Brasileiro de Movimentos Populares em Dialogo com o Papa Francisco
Nós, Movimentos Populares e Pastorais Sociais reunidos em Mariana, Minas Gerais, em resposta ao chamando do Papa Francisco para o diálogo com os que lutam por “terra, teto e trabalho”, aqui viemos nos solidarizar com as famílias atingidas pelo maior crime socioambiental provocado em 2015 pela mineração no Brasil e alimentar nossa esperança na construção de outro mundo possível.
Povos indígenas, quilombolas, pescadores, comunidades tradicionais, trabalhadores e trabalhadoras do campo e da cidade, agentes das pastorais sociais compartilhamos nossas experiências de lutas, dificuldades numa sociedade tão desigual. Debatemos a opressão das forças do capital, a fragmentação e criminalização dos movimentos sociais e as violências contra os pobres, negros, mulheres, jovens e LGBTs. Aprofundamos nossa reflexão e partilha das formas de resistência e luta, para enfrentar esses desafios.
Clamamos junto com a Mãe-Terra, que o uso intensivo de agrotóxicos provoca a morte de nossos povos e rios. Denunciamos que a concentração da propriedade e o estímulo ao agronegócio geram conflitos e violências no campo e na cidade, por isso se tornam urgentes e necessárias a Reforma Urbana e a Reforma Agrária.
Queremos o fim da especulação imobiliária. Apesar dos avanços na política de moradia popular, a carência por moradia cresce a cada ano. O avanço do capital nos territórios, com estímulo ao extrativismo mineral, deixa um rastro de destruição ambiental, do qual o crime na Bacia do Rio Doce, provocado pela Vale e BHP Billiton, por meio da Samarco, com a conivência do Estado, é um dos exemplos mais terríveis.
Neste momento de trevas no país, o encontro brasileiro surge com uma luz. Nos últimos anos, o modelo de desenvolvimentos adotado foi favorecido pelo contexto internacional, possibilitou avanços e garantias de direitos sociais, mas muito lucro para o capital. Com a crise do capitalismo mundial iniciada em 2008, este modelo se esgotou. As forças do capital querem garantir seus interesses, mas nosso povo vem resistindo. Tomaram o governo federal por meio de um golpe, com apoio do Congresso Nacional e do Judiciário brasileiro, impondo o modelo neoliberal derrotado por quatro vezes nas urnas.
Dizemos não às privatizações propostas pelo governo interino e golpista, não ao desemprego e à terceirização que ameaçam diretos dos trabalhadores e trabalhadoras. No Brasil, a democracia sempre foi resultado da organização e da luta do povo. Uma vez mais é preciso fortalecer a aliança das classes populares. Mais do que isto, estamos desafiados a construir um novo projeto para o país. Projeto que além de garantir terra, teto e trabalho para todos e todas, com justiça social, esteja em sintonia com a Mãe-Terra.
Nós em diálogo com o Papa Francisco, reafirmamos o que está na Encíclica Laudato Si’: “Não há duas crises separadas: uma ambiental e outra social; mas uma única e complexa crise socioambiental. A solução requer uma abordagem integral para combater a pobreza, devolver a dignidade aos excluídos e, simultaneamente, cuidar da natureza.”
Quem não luta, está morto! Quem luta, educa.
Com nossa fé revolucionária, fortalecemos nossa esperança na caminhada e a certeza na chegada. É preciso lutar para derrotar o golpe no Brasil, por isso nos comprometemos a ampliar as mobilizações, fortalecendo e diversificando os trabalhos de base, o diálogo entre os movimentos e ocupando as ruas. A luta imediata deve ser fermento no processo de construção de um projeto popular de país.
Encerramos o encontro no subdistrito de Paracatu de Baixo, com nossos pés na terra devastada pela ganância do capital, e em diálogo com os atingidos reforçamos nossa solidariedade e compromisso com a luta pela justiça, reparação e empoderamento do povo da Bacia do Rio Doce.
Após estarmos reunidos em Roma (2014), na Bolívia (em 2015), queremos convidá-lo a promover em terras brasileiras o 3º Encontro Mundial dos Movimentos Populares em Diálogo com o Papa Francisco, em outubro de 2017, em Minas Gerais. O convite é para manter viva a memória e o nosso compromisso de “cuidar bem da nossa Mãe-Terra, como Casa Comum de todos.
Ao som dos sinos de Mariana, ecoando a dor dos Atingidos e atingidas, clamamos por Justiça!
Mariana, Minas Gerais, Brasil, 4 de junho de 2016.
CARTA DO 1º ENCONTRO REGIONAL DO MOVIMENTO DE MULHERES CAMPONESAS SUDESTE E CENTRO-OESTECARTA DO 1º ENCONTRO REGIONAL DO MOVIMENTO DE MULHERES CAMPONESAS SUDESTE E CENTRO-OESTE
Valadares, 04 de junho de 2016.
Nós mulheres do Movimento de Mulheres Camponesas reunidas no 1º Encontro das regiões do Sudeste, Centro-Oeste e Estado da Bahia no município de Governador Valadares-MG, queremos publicamente nos manifestar frente ao atentado a nossos direitos e a democracia.
Nosso país foi tomado de forma golpista por grupos que historicamente fizeram do nosso país e de seus bens, fruto de acumulo de riquezas, controlando os grandes meios de comunicações que dominam grande parte dos poderes da República. Mantiveram por décadas sob jugo todo um povo lutador e trabalhador. Este não saciado sua ganância, derruba de forma ilegítima sua presidenta eleita por voto popular. Impõem sua agenda de desconstruir todos os programas e políticas que no último período construímos com lutas, ações e pautas de negociações junto ao governo federal.
Está em curso a dilapidação do nosso patrimônio público como políticas econômicas e sociais, desmonte de ferramentas do estado que dialogue e representa políticas como o MDA, SEPIR e SPM, mostrando com que veracidade quer acabar com direitos legalmente constituídos. Reafirmamos nosso direito de organização, ações e protestos, não permitiremos ser retirados os direitos à seguridade social no que tange a saúde, assistência e previdência com ataque sistemático em especial a previdência rural, propondo aumento de idade, igualar idades entre homens e mulheres, campo e cidade, bem como a desvinculação do salário mínimo ao benefício.
A aposentadoria, salário maternidade e pensões trás condições de vida digna às pessoas no período de fragilidade ou velhice. Além de garantir também uma circulação da economia em 70% dos municípios.
A previdência é fruto de muita luta das mulheres e homens da classe trabalhadora e dela não abriremos mão, nos manteremos vigilantes e alertas e já articuladas e organizadas para enfrentar toda e qualquer ofensiva de retirada de nossos direitos.
Da luta não fujo, na luta continuaremos!
Não ao golpe! Fora Temer!