25/10/2016 - MMC - Movimento de Mulheres Camponesas
MMC
A Previdência é sustentável, mas seus recursos estão em disputa
Por trás do suposto déficit há uma falácia, que penaliza os contribuintes diretos e indiretos do regime de seguridade social
Na narrativa dos meios de comunicação, e particularmente de seus comentaristas/especialistas, a reforma da Previdência é apresentada hoje como um “mal necessário”. Uma medida que resolveria a crise econômica brasileira, lado a lado com a PEC 241 – que pretende limitar os gastos públicos nos próximos 20 anos e, na prática, retirará verbas da educação e da saúde para privilegiar o pagamento da dívida pública.
No artigo abaixo, escrito por Rivânia Moura, doutora em Serviço Social pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e professora da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN), percebemos que, longe de ser a única saída, a reforma da Previdência é uma narrativa ideológica e que tem um fim bastante específico: direcionar recursos para o mercado de capitais.
Agradecemos à profa. Dra. Rivânia Moura por ter aceitado o convite de compartilhar seus conhecimentos sobre o tema, que é seu objeto de pesquisa.
A Previdência Social é sustentável, o que está em disputa são os seus recursos
Por Rivânia Moura
A Previdência Social é fruto de uma intensa luta dos trabalhadores. Ela representa uma perspectiva de solidariedade intergeracional e de capacidade para o trabalho, já que aqueles/as inseridos no mercado contribuem diretamente para a proteção social dos que perderam temporária ou permanentemente a sua capacidade laborativa.
Conta também com a solidariedade do Estado no que diz respeito à contribuição e à garantia das aposentadorias e benefícios previdenciários.
Para além da materialização do direito à sobrevivência dos trabalhadores, porém, a Previdência torna-se uma grande fonte de arrecadação administrada pelo Estado e, nesse sentido, os seus recursos se constituem como objeto de disputa também pelos capitais.
O discurso recorrente da necessidade de contenção dos gastos previdenciários começa a ser deflagrado a partir da década de 1940, mas ganha mais força na década de 1980, mediante os altos índices de desemprego, inflação e crise econômica.
Os argumentos de comprovação do déficit previdenciário então estavam circunscritos em envelhecimento populacional; descompasso entre arrecadação e despesas, entre trabalhadores ativos e inativos, principalmente, devido ao desemprego; aumento da expectativa de vida. Sobressai desse contexto o discurso da inviabilidade de manter a política previdenciária nos mesmos moldes e a necessidade de operar uma "reforma".
A análise feita pela Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil (Anfip), porém, confirma que o déficit é artificial, é manipulado, e que o sistema é superavitário. O cálculo apresentado pelo governo mostra gastos maiores do que os recursos arrecadados pelo sistema previdenciário.
Esse cálculo leva em consideração somente como receitas as contribuições dos trabalhadores, do empregador e os recursos próprios da previdência; e como despesas as aposentadorias e benefícios pagos aos segurados. Com base nesses cálculos o governo apresenta um déficit previdenciário em 2015 de 85,816 bilhões de reais.
Existe, contudo, uma receita não contabilizada pelo governo que se constitui de impostos destinados ao fundo da seguridade social, quais sejam, Contribuição Social sobre o Lucro Liquido (CSLL), Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins), concursos de prognósticos, dentre outros. Ao acrescentar nas receitas todas as arrecadações fica comprovado que a Previdência é superavitária. Pelas contas da ANFIP o superávit da seguridade social em 2015 foi de 23,948 bilhões de reais.
As contribuições não computadas pelo governo fazem parte das arrecadações da seguridade social e, portanto, da Previdência Social e foram inseridas a partir da Constituição de 1988 como uma das alternativas para manter a estabilidade do sistema previdenciário.
Assim, os argumentos reunidos para justificar a necessidade da “reforma” não são justificáveis pelo orçamento. Ao contrário, são elaborados no intuito de direcionar os recursos da Previdência para o mercado de capitais.
Isso porque, no Brasil, a Previdência Social se configura como um modelo de repartição no que se refere à arrecadação, pois tem como principal fonte de custeio a contribuição direta dos trabalhadores; e, como um modelo de capitalização das suas reservas orçamentárias – superávit – por permitir ao Estado destinar os recursos da previdência para a acumulação capitalista.
Deste modo, o descompasso entre receitas e despesas não se deve por um desequilíbrio próprio da previdência social, mas decorre principalmente da destinação de seus recursos.
O modelo de acumulação pautado no protagonismo do capital portador de juros impõe ajustes estruturais que, em geral, têm sido implementados no sentido de exigir cortes no orçamento do Estado para com os direitos dos trabalhadores.
A necessidade de impor novas regras para as aposentadorias e reestruturar a política pública de previdência fez/faz parte do pacote de medidas exigidas pelo grande capital para transformar o País na “plataforma de valorização financeira” (PAULANI, 2010).
Abrir a Previdência ao mercado de capitais tornou-se garantia de que o País estava preparado para expandir e diversificar esse mercado e, ademais, estava disposto a manter os compromissos de superávit primário e pagamento dos encargos da dívida pública.
O discurso do déficit da Previdência operou em conjunto com as ideias que defendiam a necessidade de redução do Estado e de crise econômica provocada pelo excesso de gastos do poder público. A propagada inevitabilidade de redução do tamanho do Estado é, na verdade, a forma encontrada para alargar o fundo público ao capital, para dotar o Estado da legitimidade em transferir recursos para a acumulação capitalista e, deste modo, torná-lo mecanismo imprescindível à busca desenfreada do capital para elevar a taxa de lucro.
Não significa de fato uma redução do Estado e sim um direcionamento dos recursos e destinos do fundo público.
O processo em curso de tornar a Previdência Social cada vez mais reduzida aos trabalhadores com baixos salários fortalece, em contrapartida, o avanço do capital sobre as receitas advindas desta política.
Os recursos da previdência no cenário brasileiro após os anos 1990 vêm cumprindo o papel de diversificar o mercado de capitais. Primeiramente, o mecanismo da Desvinculação de Receitas da União (DRU) permite que parte das receitas da seguridade social – 20% até 2016 e 30% de 2016 a 2023 – seja utilizada para pagar juros da dívida pública.
Em segundo lugar, foram criados mecanismos capazes de canalizar o dinheiro das aposentadorias e pensões para o domínio do capital que porta juros: os fundos de pensão e o crédito consignado cumprem essa função ao possibilitar que uma parcela considerável desse dinheiro fique sobre o domínio dos bancos e instituições financeiras com a potencialidade de ser transformado em capital.
O crédito consignado se tornou uma grande estratégia dos bancos para se apropriar das aposentadorias. Com um dinheiro seguro para remunerar o capital portador de juros, os consignados foram a modalidade de crédito que mais cresceu nos últimos dez anos, tendo sido também responsável pelo alargamento da lucratividade bancária.
Entre 2004 e 2015 foram concedidos empréstimos consignados para aposentados e pensionistas do Regime Geral da Previdência Social num montante superior a 200 bilhões de reais. Significa afirmar que o capital encontrou nos consignados um potência inteiramente nova de expropriação do trabalho.
Diversas formas de canalizar os recursos da Previdência para o capital financeiro foram operadas mediante o incentivo e regulamentação do Estado. O fato é que a Previdência continua a ser uma fonte importante para a reprodução do capital e para as tentativas de elevação das taxas de juros, agora sob a égide do processo de financeirização da economia e das políticas sociais.
Ademais, as propostas de contrarreforma da Previdência encaminhadas pelo governo Temer preveem: a instituição de uma idade mínima para aposentadoria, entre 65 e 70 anos; a equiparação dos regimes de previdência; o pedágio para quem tem mais de 50 anos de idade; a equivalência das regras para homens e mulheres; o fim das aposentadorias especiais; a retirada dos trabalhadores rurais do regime geral de previdência e o aumento da alíquota de contribuição dos trabalhadores.
Pensar a manutenção da Previdência Social requer, portanto, analisar as possibilidades de arrecadação para além da contribuição direta dos trabalhadores; requer antes de tudo estabelecer formas diversificadas de financiamento da Previdência que possibilite taxar as grandes empresas, o agronegócio, acabar com as isenções fiscais. Requer um amplo processo de luta dos trabalhadores.
Uma questão importante para pensar o equilíbrio do sistema previdenciário diz respeito ao tratamento dado às receitas advindas da contribuição das empresas. As renúncias fiscais, em 2015, foram responsáveis por 40,124 bilhões de reais que deixaram de ser arrecadados pela Previdência Social, o que em parte já resolveria metade do suposto déficit.
A desoneração da folha de pagamento em que as empresas deixam de contribuir com 20% sobre o montante dos salários e passam a contribuir com base na receita bruta também foi um mecanismo que favoreceu as empresas, à medida que diminuiu o montante da contribuição dos empregadores para a Previdência Social. De acordo com a projeção da Receita Federal, em 2015 a desoneração da folha estava em torno de 25 bilhões de reais.
A justificativa falaciosa do déficit penaliza os trabalhadores que contribuem direta e indiretamente para a Previdência Social e atende aos anseios do capital de liberar mais recursos do fundo previdenciário para o mercado de capitais.
Com essa clareza não podemos aceitar o argumento do déficit e da insustentabilidade da Previdência; não podemos pagar pela crise; não podemos abrir mão da nossa condição de sobrevivência. A Previdência envolve direta ou indiretamente todos os trabalhadores e por isso a sua defesa tem de ser ampla e unificada.
A estrada é de terra e a mata, fechada. Quanto mais caminhava, mais ameno o clima ficava, em cima da montanha havia brisa fresca, apesar do sol quente. A placa indicava que chegávamos à Comunidad Santa Julia del Crucero, de longe vi que a comunidade estava em festa. Decorada com bexigas verdes e lilás e faixas de boas-vindas, a Cooperativa de Mulheres Glória Quintanilla se apresentou como espaço político em que jovens, adultas e idosas da comunidade se organizam, buscando alcançar a soberania alimentar com projetos que promovem a agroecologia e estabelecer relações igualitárias…
Juventude da Via Campesina denuncia o golpe na educação
A saída para a crise não passa pelo ataque aos direitos do povo brasileiro. Usam a desculpa da crise para aumentar a desigualdade social e retirar nossos direitos
Em nota, a juventude da Via Campesina Brasil repudia o governo golpista e denuncia o retrocesso na área da educação proposta pelas medidas neoliberais que estão sendo implantadas no país.
“Precisamos de um amplo processo de debate e construção de uma profunda reforma da educação, mas é fundamental que ocorra de acordo com os interesses do povo brasileiro e de sua juventude. Continuaremos ocupando escolas, praças, instituições e latifúndios, mobilizando e convocando toda a juventude a se juntar à luta e barrar o golpe e toda ofensiva contra o povo brasileiro!”, afirmam em trecho da nota.
A nota ainda aponta que nesse contexto de golpe, a juventude do campo tem sido atacada diretamente. “Estamos sendo atacados por diversas frentes. A inviabilização da Reforma Agrária, o fim do MDA (Ministério do Desenvolvimento Agrário), a proposta de Reforma da Previdência Social, o corte no orçamento do Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (PRONERA), a ameaça de entrega de nossas terras e bens naturais à estrangeiros são algumas medidas que já estão sendo tomadas e nos afetam diretamente”.
Confira abaixo a nota na íntegra.
Juventude camponesa se manifesta contra o golpe na educação
O Brasil vive um processo político com um governo golpista completamente rendido aos ditames do grande capital internacional. Essa conjuntura reposiciona a juventude na luta política, uma vez que é diretamente contra ela que se direcionam boa parte das medidas neoliberais defendidas pelo Banco Mundial e seguidas fielmente por Michel Temer e sua corja.
Nós, jovens do campo, estamos sendo atacados por diversas frentes. A inviabilização da Reforma Agrária, o fim do MDA (Ministério do Desenvolvimento Agrário), a proposta de Reforma da Previdência Social, o corte no orçamento do Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (PRONERA), a ameaça de entrega de nossas terras e bens naturais à estrangeiros são algumas medidas que já estão sendo tomadas e nos afetam diretamente.
Além da ameaça aos nossos territórios e à natureza, o (des)governo golpista escolheu outra frente de ataque: a educação. Nesse momento, duas medidas aparecem como ataques diretos a esse direito fundamental, a Proposta de Ementa Constitucional (PEC) 241 e a Medida Provisória (MP) nº 746/2016 de reforma do Ensino Médio.
A PEC 241 propõe congelar o investimento nas áreas sociais por 20 anos, atingindo especialmente a saúde, educação e assistência social. Somente nos primeiros anos, em caso de se efetivar esta PEC, a Educação perderá 58,5 bilhões de reais, na Saúde são 161,04 bilhões e a Assistência Social 125,3 bilhões de reais. Saúde e educação são direitos fundamentais, porém ainda estão extremamente precarizados, principalmente para a população camponesa.
A Medida Provisória 746/2016 que institui uma reforma no Ensino Médio, caracteriza a educação apenas como um meio de capacitação técnica de mão de obra, onde não importa a formação humana, muito menos o pensamento crítico em torno das contradições sociais.
Essa medida aponta diversos retrocessos, tais como a retirada da obrigatoriedade de disciplinas como Artes, Educação Física, Filosofia e Sociologia. Desqualifica a atuação docente ao permitir que qualquer pessoa, que seja entendida como de “notório saber”, possa atuar como educador, sucateando o ensino e esvaziando de conhecimento os processos escolares formativos.
Não é por acaso que a MP 746/2016 segue o rito da Lei 5.692/71, implantada na ditadura militar que também retirou as disciplinas de Filosofia e Sociologia e em seus lugares colocaram a disciplina Educação Moral e Cívica. O objetivo é garantir a hegemonia política-ideológica em todos os níveis da educação, agudizar a relação direta e imediata entre educação e produção capitalista.
Há ainda, o Projeto Escola sem Partido (PLS 193/2016, PL 1411/2015 e PL 867/2015) ou “Escola com Mordaça”, que tem como objetivo suprimir a discussão ideológica nas escolas, restringindo os conteúdos de ensino, baseado na pretensa ideia de “neutralidade do conhecimento”, inviabilizando assim a atuação dos educadores/as na construção do pensamento crítico sobre a realidade social, sobretudo os profissionais da área das Ciências Humanas. Esse PL fere o princípio do pluralismo de ideias e a liberdade de aprender, ensinar e partilhar saberes que representam uma visão crítica sobre o mundo.
O movimento de ocupação das escolas pelos jovens secundaristas, que vem ganhando força em todo país, se configura como ferramenta política importante na luta contra todas essas medidas reacionárias, bem como na luta contra a negação do direito a Escola e a educação pública de qualidade. Essas lutas são expressão da insatisfação da juventude com todo esse desmonte da nossa Educação, já tão precária. Demonstra o reconhecimento de que a Educação e a Escola pertencem a esses sujeitos e por tanto deve atender as suas necessidades e não responder a manutenção do status quo.
A emergência destas medidas só pode ser compreendida em contexto de um golpe, que tem interesse em aplicar o receituário neoliberal na educação e assaltar os fundos públicos que a financiam. Não à toa, é que na própria Justificativa do MEC, na mensagem de envio da MP ao Congresso Nacional menciona uma pesquisa realizada pelo Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap), com o apoio da Fundação Victor Civita – FVC, esta última sendo a pessoa jurídica da Revista Veja, e ainda afirma atender, tal reforma, às recomendações do Banco Mundial, essa instituição interventora, cujo papel tem sido o de ajustar as políticas públicas dos países da África, Ásia e América Latina às necessidades do capital. Portanto, a educação está no centro dessa disputa.
A saída para a crise não passa pelo ataque aos direitos do povo brasileiro. Usam a desculpa da crise para aumentar a desigualdade social e retirar nossos direitos. O que está em jogo nesse debate é a quem o Estado e a educação devem servir.
Por isso, nós, juventude da Via Campesina Brasil nos somamos à luta pela:
Fora Temer;
Garantia de 75% dos royalties do pré-sal para educação e 25% para a saúde;
Revogação da Media Provisória Nº 741/2016 de reforma do ensino médio;
Arquivamento da PEC 241 que congela investimentos nas áreas sociais;
Precisamos de um amplo processo de debate e construção de uma profunda reforma da educação, mas é fundamental que ocorra de acordo com os interesses do povo brasileiro e de sua juventude. Continuaremos ocupando escolas, praças, instituições e latifúndios, mobilizando e convocando toda a juventude a se juntar à luta e barrar o golpe e toda ofensiva contra o povo brasileiro!
CONTRA O GOLPE NA EDUCAÇÃO!
NENHUM DIREITO A MENOS!
EDUCAÇÃO É DIREITO. NÃO É MERCADORIA.
Juventude da Via Campesina Brasil
MST – Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra
MPA – Movimento dos Pequenos Agricultores
MAB – Movimento dos Atingidos por Barragens
MMC – Movimento de Mulheres Camponesas
FEAB – Federação dos Estudantes de Agronomia do Brasil
CPT – Comissão Pastoral da Terra
PJR – Pastoral da Juventude Rural
ABEEF – Associação Brasileira dos Estudantes de Engenharia Florestal
CIMI – Conselho Indigenista Missionário
MPP – Movimento de Pescadores e Pescadoras Artesanais do Brasil
MAM – Movimentos pela Soberania Popular na Mineração
CONAQ – Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades negras Rurais Quilombolas