FEMINISMO CAMPONÊS POPULAR: UMA ABORDAGEM ANTIRRACISTA
"Tem que haver um feminismo que seja amplo. Que reconheça que o capitalismo sempre esteve conectado com o racismo." (Angela Davis)
No nosso acúmulo organizativo, político e histórico já temos bastante convicção de que nossa luta é (e sempre foi) feminista e de que somos parte da luta pela transformação da sociedade, somos parte da luta de classe. Essa sociedade que queremos transformar é Capitalista, pois vive da exploração do trabalho, dos bens naturais e assim tenta transformar tudo em mercadoria; nossas sementes, territórios, terra e em especial nossa vida e nossos corpos. É Patriarcal, porque organiza a vida social pelo princípio da divisão sexual do trabalho que separa e hierarquiza os trabalhos de homens e de mulheres, é um sistema que busca manter o poder do homem sobre a mulher, como se ela fosse sua propriedade. E é Racista, pois ainda prevalece a atribuição de superioridade aos brancos em detrimento de outros povos (no caso do Brasil), em especial, ao povo negro e indígena e, por meio desta atribuição de superioridade são naturalizadas diversas formas de violências e discriminações contra esses povos, sob argumentos arcaicos e coloniais de inferioridade da raça/etnia, de que são povos preguiçosos, de que suas culturas são demoníacas e entre outros argumentos usados pelos colonizadores e que ainda reverberam, ora de formas veladas, ora nem tanto assim, nos dias atuais.
Portanto, afirmamos que esse sistema encontra-se amparado em um nó (Saffioti, 2013) entre Capitalismo, Patriarcado e Racismo, essas estruturantes se retroalimentam mutuamente para a exploração, espoliação, expropriação do trabalho e que fatores como gênero e raça são fundamentais no que diz respeito a maior precariedade e maior exploração dessa força de trabalho, pois são os negros e negras os mais afetados por trabalhos precarizados e informais nesta sociedade. Isso na cidade, no campo, de modo talvez mais acentuado, circula a ideia de que “as mulheres não trabalham”, apenas “ajudam” o companheiro, já que não são pagas para realizarem os trabalhos na roça, na casa e o trabalho de cuidados com a família e sua produção nos quintais, na lida com animais menores e entre outros.
Logo, quando afirmamos o Feminismo Camponês Popular o relacionamos com as nossas próprias vidas camponesas, nosso trabalho, nas especificidades em sermos do campo, das águas e das florestas, por isso afirmamos que Feminismo Camponês Popular é uma síntese do nosso modo de vida, baseado no projeto de agricultura camponesa e agroecológica e que busca construir as bases para uma sociedade sem classes, uma sociedade socialista e feminista, livre do racismo e que a busca por autonomia econômica e reconhecimento do nosso trabalho, nesse sistema, são partes primordiais na construção do nosso feminismo e de nossa libertação. Portanto, embora tenhamos firmeza de nosso horizonte socialista, também afirmamos fundamental a luta por direitos, reconhecimento de nosso trabalho e políticas públicas que possam melhorar as nossas vidas nos territórios via Estado.
Outro fator sobre o feminismo que construímos é que ele deve contemplar a diversidade do campo, ou melhor, a das mulheres camponesas. E é pensando a diversidade do campesinato brasileiro, logo a diversidade que somos enquanto mulheres que compõem esse campo, que propomos uma abordagem na perspectiva antirracista, pois as mulheres camponesas negras e indígenas estão muito presentes em nossa organização, no campo e na sociedade de maneira geral, entendendo o Brasil como sendo um país do contato, por vezes forçado e assimétrico, entre povos, raças/etnias e culturas.
Na construção do Feminismo Camponês Popular temos a convicção de que só avançamos em uma sociedade socialista se todas as mulheres forem livres, mas, além disso, temos a compreensão que existem assimetrias em como as mulheres vivenciam as explorações e violências nesta sociedade de classes. Não tratamos a questão racial como um tema ou como algo isolado, mas imbuído na base de exploração neste sistema injusto.
Enquanto mulheres (negras e indígenas) camponesas que compomos esse campo brasileiro, cheio de conflitos e concentração de terra, logo, sujeitas da construção do Feminismo Camponês Popular, precisamos cada dia avançar na afirmação de nossas raízes afro-brasileiras e indígenas. Buscar em nossas ancestralidades os conhecimentos medicinais, as tecnologias que contribuam na lida com a terra, a valorização da nossa cultura quilombola e indígena, da nossa culinária e reafirmar que continuamos e continuaremos lutando e resistindo pela erradicação do racismo, do patriarcado e do capitalismo, a partir do Feminismo Camponês Popular.
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Números de disque-denúncia
Central de Atendimento à Mulher – Ligue 180
Polícia Militar – Ligue 190
SAMU – Ligue 192