A retomada do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), que agora se chama Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDAAF), pasta que será responsável pelo atendimento dos setores produtivos vinculados à produção de alimento executada pelos povos do campo, das florestas e das águas, aconteceu no dia 3 de janeiro, em Brasília, em cerimônia concorrida e com participação muito potente dos movimentos populares. Paulo Teixeira (PT-SP), deputado federal reeleito para o quinto mandato, foi o escolhido para comandar a retomada do ministério que havia sido extinto no governo anterior. A pauta prioritária será a produção de alimentos e a vinculação do potencial produtivo dos movimentos sociais para a erradicação da fome.
A posse iniciou com mística dos movimentos do Campo Unitário. Sob as bandeiras erguidas de movimentos sociais populares e representações sindicais, a mística de abertura do ato de reimplantação do MDA e posse do ministro Paulo Teixeira teve a interpretação de texto por parte dos jovens militantes Mateus Quevedo (Movimento dos Pequenos Agricultores/MPA) e Divina Lopes (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra/MST).
Através do poema “A voz da terra”, de Pedro Tierra, afirmaram o amplo espectro abrangido pelo protagonismo dos povos do campo, das águas e das florestas e, sobretudo, do alimento produzido pelas mãos dos camponeses e camponesas: “A liberdade da terra não é assunto de lavradores. É assunto de todos quantos se alimentam dos frutos da terra. Do que vive, sobrevive, de salário. Do que não tem casa. Do que só tem o viaduto. Dos que disputam com os ratos os restos das grandes cidades. Do que é impedido de ir à escola. Das meninas e meninos de rua. Das prostitutas. Dos ameaçados pelo cólera. Dos que amargam o desemprego. Dos que recusam a morte do sonho”, declamaram, a duas vozes.
Ainda dentro da mística de abertura, o novo ministro recebeu das mãos de camponeses e camponesas elementos simbolizando a luta e a produção: um punhado de terra, representando a reforma agrária; um cesto de alimentos, representando a soberania alimentar; mudas de plantas, representando a agroecologia e a defesa do meio ambiente. “Nós viemos plantar esperança, transformação e mudança em um ministério que representa os nossos povos, um ministério que não pode ser feito sem a agroecologia, não pode ser feito sem combater o racismo, o patriarcado e o machismo”, afirmou Edcleide Rocha, dirigente do Movimento de Mulheres Camponesas (MMC).
A cerimônia de posse teve forte protagonismo dos movimentos sociais que, de forma unitária, foram representados pelo dirigente do MPA (Movimento dos Pequenos Agricultores) e Via Campesina, Frei Sérgio Görgen, que destacou: “a força e o tamanho do desafio que nós temos, de buscar a superação da fome nesse país e a superação da pobreza no campo”. Görgen apontou ainda que chagas históricas – como o genocídio indígena e a escravidão – continuam abertas e somente poderão ser resolvidas com a superação da concentração da terra.
Durante a cerimônia, o vice presidente Alckmin mostrou-se à vontade entre os representantes dos movimentos, afirmando simpatia pelos pontos de pauta apresentados. Ao dirigir-se a Teixeira, o vice-presidente afirmou a grande expectativa do presidente Lula para com um bom desempenho da pasta e o seu caráter decisivo para a prioridade do novo governo: a erradicação da fome no país.
O vice presidente é também Ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio. “Tenho certeza que Paulo vai fazer um grande trabalho no MDAAF, o presidente Lula foi muito feliz ao escolhê-lo porque tem a sensibilidade, o espírito público e vai fazer um grande trabalho”, afirmou. Para Alckmin, a recriação do MDA reafirma o reconhecimento por parte do novo governo sobre “a importância da reforma agrária e do trabalho no campo, da produção de alimentos, da preservação do meio ambiente e da agroecologia”.
No momento também se pronunciou Gleisi Hoffmann, a presidenta do PT, dizendo: “É uma alegria muito grande a gente voltar com o MDA, sentimos falta desse ministério nos últimos anos e lembramos como ele foi importante nos nossos governos para a segurança alimentar, para a produção no campo e para a valorização do campo brasileiro”.
Paulo Teixeira, prometeu em seu discurso de posse que o ministério estará sempre de “portas abertas” para o Campo Unitário e movimentos populares, e também retomou a CONAB para o Ministério.
O novo ministro referiu-se em seu discurso ao desafio apresentado pelo presidente Lula ao convocá-lo para assumir a pasta: “Hoje, nós reiniciamos esse desafio de erradicar a fome e dar condições mais dignas ao povo que vive no campo”. Além de firmar compromisso com o desenvolvimento de políticas públicas de valorização dos trabalhadores e trabalhadoras do campo, colocou a Reforma Agrária como prioridade: “Queremos resgatar o papel do estado brasileiro, que através desse e de outros ministérios, deve promover o acesso à terra. Temos milhares de famílias vivendo em acampamentos, beira de estrada, condições paupérrimas em um país plenamente capaz de oferecer terra e moradia aos seus filhos e filhas.”
Sob o olhar de representantes de pelo menos uma dezena de movimentos sociais, bem como de representações de federações de trabalhadores rurais familiares e camponeses, o ministro prometeu manter canais de conversação de forma constante: “A missão desse ministério é também manter boa articulação com os movimentos sociais. Iremos trabalhar com porta aberta, em um diálogo permanente, acolhendo sugestões e críticas”. Fazendo referência ao termo utilizado por Frei Sérgio, Teixeira afirmou que vai valorizar a “amizade incômoda” e convocou dirigentes e militância a permanecerem mobilizados por suas pautas: “Venham para cima para que tudo possa acontecer nesse trabalho do ministério”.
Cabe destacar que um fato simbólico e de reafirmação do lugar desse ministério durante a posse do ministro, foi a reabertura do espaço da Companhia Nacional de Abastecimento (CONAB), que teve ações suprimidas no governo passado e volta a ser valorizada com a importância de integrar este ministério para garantir a compra da produção familiar e camponesa e a distribuição da alimentação para o abastecimento popular.
Texto original: Marcos Corbari (MPA)
Adaptação: Edcleide Rocha (MMC)