Posicionamento do Fórum Brasileiro de Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional sobre os recentes acontecimentos políticos - MMC - Movimento de Mulheres Camponesas

Notícia

Posicionamento do Fórum Brasileiro de Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional sobre os recentes acontecimentos políticos

O Fórum Brasileiro de Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (FBSSAN) foi criado em 1998 motivado pela identificação de que a sociedade civil precisava de um espaço de mobilização e organização para lutar pela Segurança Alimentar e Nutricional uma vez que a violação do direito humano à alimentação constituía-se em grave problema nacional, historicamente negligenciado pelos governos.
 
A atuação do FBSSAN tem sido balizada pela constante análise da conjuntura e pelo posicionamento ético e crítico diante das transformações dos cenários político, econômico, social e cultural do país que impactam de forma contundente o acesso à alimentação adequada e saudável e o sistema alimentar que o sustenta. Desta forma, avaliamos que foram importantes as vitórias alcançadas na construção do marco legal do Direito Humano à Alimentação Adequada (DHAA) e de políticas públicas voltadas para a erradicação da fome e a promoção da Segurança Alimentar e Nutricional (SAN). A redução da pobreza e da desigualdade possibilitou maior acesso à alimentação pela população mais pobre. O acesso à alimentação adequada e saudável é um direito social previsto na Constituição Federal e na Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional. 
 
As vitórias e conquistas no campo da Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional no Brasil têm a forte marca da atuação da sociedade e dos movimentos sociais. É, portanto, questão inegociável a manutenção e ampliação do apoio efetivo à participação popular e ao controle social o que só é possível em ambiente democrático. 
 
Os últimos acontecimentos têm provocado um sinal de alerta. A Constituição Federal instituída em 1988 vem sendo violada diariamente, a partir da atuação conjunta de um setor majoritário do sistema de justiça no país, ao lado de grandes órgãos de imprensa e de partidos de oposição que nunca se conformaram com a última derrota nas urnas, em 2014. Aliado a este grupo encontram-se representantes do grande capital nacional e internacional, todos interessados em que se desencadeie novamente no país um processo de privatização de empresas estatais, com particular atenção sobre a Petrobrás. 
 
Utilizam o argumento da corrupção como artifício para impor no país um projeto retrógrado e contrário à maioria do povo brasileiro. Não aceitam os avanços sociais que permitiram retirar da pobreza muitos milhões de pessoas, bem como erradicar a fome endêmica que perdurou por séculos no Brasil. 
 
Na apuração dos casos de corrupção efetuam um processo seletivo, poupando justamente aqueles que historicamente sempre desviaram recursos públicos em favor de seus interesses privados. Centram seus esforços em responsabilizar um único partido e a membros do governo federal. Tem como objetivos maiores a prisão do ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva e o impeachment da atual presidenta Dilma Rousseff. Repetem no Brasil a mesma fórmula já experimentada em Honduras e no Paraguai, expulsando do poder aqueles que foram legitimamente eleitos, ao mesmo tempo que projetam assumir o governo com uma feição aparentemente democrática, mas através de um método que fere severamente o Estado de Direito no país. 
Incriminam os legítimos movimentos sociais do campo e da cidade e fomentam o ódio através de noticiário falso, que visa confundir a população e levá-la a ver esses movimentos como perigosos inimigos. Cresce no Brasil uma onda tipicamente fascista, que coloca enorme risco à continuidade de nosso Estado Democrático. 
 
Consideramos como graves os retrocessos e ameaças às conquistas sociais que vem sendo impostos desde o primeiro dia do governo Michel Temer dentre as quais destacamos: a extinção dos ministérios das Mulheres, Igualdade Racial, Direitos Humanos e Juventude; os anúncios de corte de orçamento para programas sociais e políticas públicas de saúde, assistência social, educação, habitação e de apoio à agricultura familiar; a indefinição acerca da manutenção e funcionamento de instâncias de controle social, dentre estas o Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional. 
 
É inaceitável a extinção do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA). Esta decisão desconsidera o papel da agricultura familiar e camponesa na produção de alimentos, pois tende a diminuir a importância e o tamanho de programas e políticas públicas que tanto contribuíram para avanços no campo da Segurança Alimentar e Nutricional, dentre estas a saída do Brasil do Mapa da Fome, conforme Relatórios da FAO em 2014 e 2015. 
 
Renovamos aqui nossa insistente e inegociável defesa da garantia do direito humano à alimentação adequada e saudável, por meio do enfrentamento das causas estruturais da pobreza, da fome e de todas as formas de alimentação inadequada. Renovamos nosso compromisso com a luta pela garantia: 
  • 1- da manutenção da participação social na proposição, formulação, monitoramento e avaliação das políticas públicas, em suas diferentes esferas de atuação; 
  • 2- do direito à terra e a reforma agrária, com a regularização fundiária das terras e territórios dos povos indígenas, quilombolas e comunidades tradicionais e com o reconhecimento destes como espaços de resistência histórica; 
  • 3- a alimentos mais sadios, sem contaminação dos agrotóxicos e sem organismos geneticamente modificados, com a intensificação dos processos de transição agroecológica e execução do Plano Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica (Planapo); 
  • 4- ao fortalecimento da agricultura familiar e a continuidade da expansão das compras institucionais por meio do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), entre outros, bem como a adequação de normas e instrumentos que se configuram como obstáculos à participação dos agricultores/as, povos indígenas, povos e comunidades; 
  • 5- a defesa da agrobiodiversidade, requisito indispensável para a soberania e segurança alimentar; 
  • 6- a instituição de uma política nacional de abastecimento alimentar que inclua os debates sobre acesso aos alimentos e padrões de consumo; 
  • 7- ao marco legal que garanta ampliação e aperfeiçoamento das ações de agricultura urbana e periurbana, assim como dos equipamentos públicos de SAN; 
  • 8- da implementação da Estratégia Intersetorial de Prevenção e Controle do sobrepeso e obesidade, nas três esferas de gestão do Sisan; 
  • 9- das ações regulatórias que controlem a expansão das monoculturas e a ação das transnacionais, que mantenham a moratória ao uso de sementes “terminator”, conhecidas como sementes suicidas; que garantam a observação do princípio da precaução no controle sobre liberação e comercialização de transgênicos e que assegurem a imediata implantação do Programa Nacional para a Redução do Uso de Agrotóxicos (Pronara); 
  • 10- de ações voltadas à regulação da rotulagem, da publicidade e das demais práticas de mercado dos alimentos, visando em especial a proteção à infância, bem como dos cidadãos que necessitam de uma alimentação adequada às suas necessidades/especificidades orgânicas. 
 
Rio de Janeiro, 06 de junho de 2016.
 

Nenhum direito a menos! 

Coordenação do Fórum Brasileiro de Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional